Conversa Aberta com o seu Orixá
Autor Desconhecido
Uma pessoa revoltada, que vou chamar de MARIA, resolve ter uma conversa aberta com o seu Orixá sobre tudo o que tem passado na vida.
Maria é uma mulher feita no santo (já com seus 7 anos pagos), casada, com 3 filhos com idade média de 13 anos. Mora em uma casa boa (sem luxo, mas com muita dignidade). Está afastada do santo há mais de 8 anos e atualmente não frequenta nenhuma Casa. Não tem nenhum dos seus assentos, que deixou na última Casa de santo.
Sábado, 23 horas, Maria recebe uma ligação dizendo que o seu filho mais velho se acidentou e está em um hospital, na emergência. Maria corre para lá desesperada, mas os médicos, depois de uma longa conversa, deixam Maria mais confiante na recuperação do filho. Orientada por eles, Maria permanece ao lado do filho. Após a cirurgia, o menino fica em observação.
Maria vai até uma área aberta para fumar um cigarro. Ao retornar, percebe uma correria para a sala de observação. Médicos desesperados, pedidos de equipamentos, enfermeiros sem dar explicações. Nenhum acompanhante é autorizado a ficar na sala. Outros parentes, do lado de fora da sala, preocupavam-se com o que estava acontecendo. Alguma pessoa lá dentro estava muito grave e corria risco.
Maria volta lá para fora e diz: -“Meu filho não pode morrer. Meu Pai me ajude, por favor!"
Mas o desespero de ver um filho à beira da morte, faz você dizer coisas que não deveriam ser ditas. E Maria diz: - “Não sei por que entrei para o santo, em todos os momentos em que precisei, nunca tive ajuda de vocês. Por isso que saí e não pretendo voltar!”
Nesse momento uma voz rouca, mas bem clara, responde: -“Minha filha, estou aqui. Por que a reclamação?”.
Maria, congelada, não sabia o que dizer. Achava que fosse coisa da cabeça dela por conta do nervosismo da situação. Mesmo assim, não acreditando, Maria diz: - “Só faltava isso. Meu filho internado e morrendo e eu ficar maluca”.
E a voz diz: -“ Não, minha filha, você não está ficando maluca. Sou EU mesmo, seu Pai, que estou respondendo a sua súplica, como sempre respondi”.
Maria, mesmo não acreditando de fato, resolve dar assunto àquela voz. E diz: -“Já que está aqui me respondendo, eu vou dizer tudo que sinto”
E a voz diz: -“Faça isso, minha filha, é por isso que estou aqui”. E a voz continua: -“Sempre estive, vou ouvir as suas reclamações”.
Maria, aproveitando a oportunidade e mesmo sem acreditar, ainda diz:
-“Então tá, já que está pedindo (ainda sem acreditar)... Fiz o santo sem condição, gastei o que podia e o que não podia. Muitas vezes, não tinha muito que comer. O pai de santo nada fazia para me ajudar. Quando ele resolveu sentar para jogar, você (?) diz no jogo que tudo vai melhorar!?! Isso é reposta? Para quem estava naquela situação...”.
E voz tenta falar: -“Mas minha filha”.
E Maria interrompe: -“Espere aí!! Não pediu? Então vai ouvir. Eu estava aqui quieta...”.
E voz: -“Esta bem, minha filha, vou ouvir você”.
Maria, então, continuando:
-“Meu marido ficou desempregado, ficamos sem casa, morando de favor, nada dava certo. Saí daquela Casa, fiquei longe um tempo. O pai de santo me cobrava a mensalidade, mas eu não tinha. Tudo atrasado: aluguel, cartão, escola. Tive que colocar meus filhos em escola do Estado. E, sem contar, que meu irmão ficou mal de saúde e eu nem tive como ajudar. Procurei uma casa de santo. Essa mãe de santo jogou e me disse que eu tinha que fazer um ebó para tudo melhorar. Arrumei dinheiro emprestado para comprar as coisas, fiz tudo o que foi pedido. E nada mudou. Então para que eu estou na religião? Para gastar com o santo e nada melhorar? Não quero mais. Meu filho está aqui, entre a vida e a morte e eu aqui ouvindo uma voz do além, quem nem sei quem é. Tô fora...”.
A voz pacientemente diz:
-“Minha filha, me ouça. Quando você estava para nascer, Iemanjá me perguntou se eu queria uma filha. Na hora disse que sim e não me arrependo dessa decisão.
Você passou dificuldades na vida porque assim estava escrito, mas eu não deixei você e seus filhos morrerem de fome, sempre coloquei alguma coisa na sua mesa. Quando você tinha 15 anos, você foi atacada por uma pessoa que tinha nela um egun encostado. Pedi a Exu que fizesse algo rápido e ele colocou outro rapaz para te defender. Aquele rapaz, de bermuda comprida e sem camisa, era seu Exu que foi te salvar e logo desapareceu”.
Maria, pensativa, disse:
– “Eu o procurei depois para agradecer, mas ele não estava mais lá”.
E a voz continuou:
-“Quando você fez o santo, o zelador não falou para você, mas ele viu que se não fosse feito, hoje você estaria seriamente doente. Mas Omulu, depois da feitura, teve permissão para te ajudar e te curar de uma vez. A Casa não era boa, mas, naquele instante, era o que você precisava. Então, sobre o ebó, ajudou bastante e foi por isso que eu disse, no seu jogo, que tudo ia melhorar. E melhorou.
Quando faltou dinheiro, não foi culpa minha. Você gastou e comprou muitas coisas sem a necessidade. E, muitas vezes, esqueceu-se de mim, do seu Exu, de Omulu que curou você. Você foi a várias festas em dias que deveria estar no Barracão. Tinha Bori de outros irmãos, tinha feitura da sua irmã de Oyá. Você disse ao pai de santo que não estava bem e foi para a festa.
O ebó que você fez, que pedi no jogo para ser feito, tinha o objetivo de afastar umas coisas ruins que estavam ao seu lado, atrasando sua vida. E EU estava levando a culpa por isso.
No dia que você completava 10 anos de santo feito, você estava de preto no casamento do seu sobrinho e nem lembrou da data. Eu não pedi nada a você, mas, pelo menos, um branco pelo dia você deveria ter colocado.
Quantas vezes você andou com o meu fio de conta escondido na sua bolsa? Você tem vergonha de mim? Tem vergonha da sua religião? O seu Exu veio me dizer que você estava correndo risco de acidente. Você Lembra?”
E Maria responde:
-
“Lembro sim. Me machuquei muito naquele dia”.
E a voz continua:
-
“Sim, eu sei disso. Mas o que você não sabe é que eu pedi a Exu para não deixar nada de muito grave acontecer com você. E ELE o fez. A pessoa ao seu lado faleceu, a pessoa que estava na frente até hoje precisa de médico e vai continuar por um bom tempo. Mas você, logo se recuperou. Pedi a Ogum, em seu nome, que não deixasse o carro cair para o lado do muro que separa a estrada do barranco. E ELE me atendeu. Ali, naquele ponto, mora um Egun revoltado e antigo, por isso tem acidentes e mortes. O seu primo que dirigia o carro estava bêbado e o egun o usou para atingir vocês.
Quer que eu fale sobre o seu irmão? Você não foi ajudar, mas pediu tanto por ele, chorou tanto, que resolvi pedir a Xangô. Xangô o ajudou e ele, hoje, está muito bem e até ganhou o processo que se arrastava lá nos homens de toga. Não é verdade?”.
Maria, sem entender o que se passava, com os olhos cheios de lágrimas respondeu que sim.
E a voz diz:
– “Minha filha, não acuse o seu Pai pelos seus erros. Muito ao contrário: enquanto você está errando, Eu estou aqui tentando acertar com você. O seu Exu trabalha muito para te ajudar e nunca ouviu de você uma palavra de agradecimento. Você dá presentes para outros Exus que dizem que faz por você e não fazem. Enquanto o seu, nem uma vela teve acessa... Não diga jamais que somos culpados!
Só falta eu te dizer uma coisa: a correria lá dentro não é em razão do teu filho. O motivo é o menino ao lado que vai falecer. O seu está bem, nós cuidamos dele e o médico já está vindo te chamar para que você o leve para casa. Que Oxalá te abençoe, minha filha!”